O deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) pretende concluir o relatório do projeto de lei do Combustível do Futuro (4.516/2023) até o fim desta semana e articular a votação da proposta no Plenário da Câmara dos Deputados ainda neste ano com o presidente Arthur Lira (PP-AL).
Há expectativa do setor produtivo com a redação que será incorporada para a política do biodiesel. No fim de semana, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sugeriu alterações no piso e no teto da mistura do biocombustível ao diesel fóssil que agradaram usinas e parlamentares.
A proposta é elevar o percentual mínimo de mistura de 6% para 10%. Atualmente, o teor está em 12%, mas o piso significa uma segurança a mais para o setor produtivo diante de eventuais cortes que podem haver.
No governo passado, por exemplo, houve interferências e decisões do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que reduziram a adição do biodiesel ao combustível fóssil para 10% quando deveria estar em 14%. Naquelas oportunidades, alguns membros do colegiado chegaram a defender redução mais drástica, para 6%. Com o novo piso proposto pelo ministério, haveria uma garantia de que a mistura não seria menor do que 10%.
Outra mudança defendida pelo MME é para aumentar o volume máximo de mistura que o CNPE pode autorizar. Atualmente, a lei permite que o conselho defina a adição de até 15% de biodiesel ao diesel fóssil, percentual que está programado para ser implementado em março de 2026, mas que o setor defende que seja antecipado para o ano que vem. A proposta da Pasta é elevar o teto até 25%. O CNPE continuaria como órgão responsável por definir o cronograma de aumento da mistura.
Um interlocutor que acompanha o tema em Brasília disse que o cenário está favorável para o governo defender percentuais mais altos de mistura, já que o biodiesel está mais barato que o diesel fóssil. Com isso, adições maiores do biocombustível não resultariam em aumento dos preços dos combustíveis nas bombas, pauta cara a qualquer governante e que foi usada como argumento em ocasiões anteriores, quando o biodiesel estava mais caro, para frear os incrementos no teor de mistura.
Na última vez que o CNPE deliberou sobre o aumento da mistura, em março, o impacto previsto era de um centavo a mais por litro de diesel na bomba a cada ponto percentual a mais de mistura de biodiesel no combustível fóssil.
Arnaldo Jardim ficou contente com a posição de Silveira, mas disse que vai analisar também outras propostas sobre o tema. Ele terá reuniões com interlocutores do governo, parlamentares e integrantes do setor produtivo em Brasília até quarta-feira para tentar construir convergências no texto final. Há possibilidade de encontro com o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, para buscar o consenso.
“O importante é dizer que o biodiesel será incluído no projeto e que teremos metas fixadas. Qual vai ser, ainda estamos definindo e buscando construir convergências”, afirmou Jardim à reportagem.
Há outras propostas sobre a mesa. Uma delas seria criar um piso para a mistura que não pudesse ser inferior aos teores já alcançados. Nesse caso, a adição não poderia ser menor do que 12%, percentual utilizado atualmente.
Outra possibilidade é a incorporação do texto de um projeto do deputado Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio), ao Combustível do Futuro. A matéria cria um plano decenal para o setor e coloca em lei a “escada” para aumento da mistura. A proposta, por outro lado, tira poder político e de barganha do governo no CNPE, atual responsável pela definição.
“São duas possibilidades e elas são convergentes. Agora a questão é escolher caminhos”, indicou Jardim.
Posições divergentes
O anúncio da posição do MME em Dubai, onde ministro e equipe técnica participam da COP 28, não surpreendeu o setor produtivo do biodiesel, que tem atuado para garantir o aumento da mistura. O pleito, até então, era passar o teto de 15% para 20% — teor que já havia sido comentado em diversas oportunidades pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin.
“O anúncio representa um avanço de extrema importância levando em conta a série de retrocessos sofridos no governo passado que prejudicaram a indústria do biodiesel e com impactos holísticos na economia, da segurança alimentar à segurança energética”, disse a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), em nota.
Historicamente, o teor mais alto de mistura desagrada alguns setores diretamente ligados à Pasta, como o do petróleo. O ministro Alexandre Silveira está em uma rusga direta com a Petrobras, após cobranças públicas feitas por ele para a redução dos preços dos combustíveis no país e críticas direcionadas ao presidente da companhia, Jean Paul Prates.
A proposta do MME diz que a ampliação do teor de biodiesel depende de análise de viabilidade técnica e econômica. Entidades que representam o setor de transportes e montadoras de veículos também têm se posicionado contra o aumento da mistura sob o argumento de que o biocombustível gera problemas como entupimento de filtros e bicos e oxidação de tanques.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) disse que ainda não existem testes que comprovem a viabilidade da mistura com 25% de biodiesel. “Mas o próprio ministro deixou claro que o aumento no porcentual vai depender de análises técnicas e econômicas, que é o que a Anfavea defende. A entidade também é favorável à adoção do diesel verde (HVO) para a frota de veículos pesados no Brasil”, disse em resposta à reportagem.
Produção
A produção de biodiesel gira em torno de 7,4 bilhões de litros atualmente. O aumento de B12 para B14, por exemplo, poderia elevar o volume em 1,3 bilhão de litros, para 8,7 bilhões de litros. O setor produtivo já explicou ao governo que há matéria-prima suficiente para isso (75% do biocombustível é produzido a partir do esmagamento de soja) e que as usinas estão prontas para atender essa demanda sem deixar de entregar óleo, farelo e soja em grãos para os demais clientes no Brasil e no mundo.
Cada ponto percentual a mais demanda o esmagamento de 2,2 milhões de toneladas de soja, nas contas da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove).
O movimento contrário ao aumento da mistura do biodiesel ainda está calcado no impacto inflacionário que a medida pode gerar e nos prejuízos que a elevação do teor poderia causar ao mercado de diesel nacional — já que a discussão sobre a qualidade do biocombustível foi “equacionada” com o novo padrão estabelecido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O economista-chefe da Abiove, Daniel Furlan, disse que o biocombustível não tira espaço do diesel brasileiro e que compete com o combustível fóssil que é importado. "O preço do biodiesel e o de paridade de importação de diesel mineral estão muito próximos, então o impacto no IPCA ou no IGP é muito próximo de zero. O biodiesel não tira mercado das refinarias nacionais", disse Furlan. Segundo ele, 23% do abastecimento de diesel do país ainda é atendido com o combustível importado, espaço que pode ser ocupado gradualmente com o biodiesel. "Estaremos trocando um produto importado e que é fóssil por um produto nacional mais sustentável, com todas as questões socioambientais que envolve, a cadeia", completou.
As importações de óleo diesel cresceram 7,1% em outubro, para 1,2 milhão de metros cúbicos. No acumulado do ano, foram importados 11,4 milhões de metros cúbicos, um pouco abaixo do patamar registrado em 2021 e 2022, quando houve um salto nessas compras. O período coincidiu com os cortes na mistura do biodiesel, que ficou estagnada em 10%.
"Mesmo que a Petrobras aumente a produção de óleo diesel, faça refinarias, que são coisas que não tem impacto no curto prazo, a importação vai continuar. Hoje, representa o dobro do mercado de biodiesel", completou Furlan.
O consumo de diesel no Brasil está próximo de 64 bilhões de litros. Dados da Empresa Nacional de Pesquisa Energética (EPE) e da ANP mostram que o aumento da produção interna de diesel fóssil será da ordem de 5 bilhões de litros por ano. Já a necessidade de importação será crescente, com 19 bilhões de litros em 2032.
Fonte: Globo Rural
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