Em um contexto de intensificação das mudanças climáticas, a transição energética e a descarbonização ganham destaque entre os compromissos estabelecidos pelos países. O planeta exige a adoção de medidas mais sustentáveis, mas, até o momento, não existe uma regra sobre qual caminho deveria ser seguido por todos.
A solução seria a adoção de veículos híbridos, híbridos plug-in, totalmente elétricos ou a utilização de biocombustíveis? A União Europeia, que havia proibido a venda de carros novos a combustão a partir de 2035, reverteu a decisão e tem enfrentado dificuldades para impulsionar o mercado de elétricos.
Já o governo brasileiro optou por um processo de descarbonização e mobilidade mais sustentável por meio de incentivos fiscais com o Programa Nacional de Mobilidade Verde e Inovação (Mover). O programa traz limites mínimos de reciclagem na fabricação dos veículos, cobrança de menos imposto para quem polui menos, criação do IPI Verde, e expansão de investimentos em eficiência energética. Mas não faz uma aposta forte em veículos exclusivamente elétricos e prevê o incentivo a biocombustíveis, na esteira da experiência de quase 50 anos dos carros a álcool.
“Podemos ter alternativas diferentes do que as que foram utilizadas em outros países”, defende Roberto Braun, diretor de Relações Públicas e Comunicação Corporativa da Toyota e membro do Conselho de Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil (MBCB). “O Brasil tem a capacidade de ser um grande protagonista na descarbonização por meio do uso do biocombustível em combinação com a eletrificação.”
Programa Nacional de Mobilidade Verde e Inovação (Mover)
Por medida provisória, o Mover foi lançado em dezembro de 2023 e regulamentado pelo governo federal em março. A iniciativa amplia as exigências de sustentabilidade no setor e estimula o desenvolvimento de novas tecnologias.
Uma das metas do programa é reduzir em 50% as emissões de carbono até 2030, que serão medidas pelo critério “do poço à roda”, que contempla todo o ciclo da fonte de energia utilizada até o veículo. O incentivo fiscal para que as empresas invistam em descarbonização, por meio de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, será de mais de R$ 19 bilhões. Até o momento, 23 companhias já fazem parte da iniciativa.
“O Mover serve como uma diretriz para todas as entidades e empresas do Brasil poderem se guiar”, avalia Braun. “O programa tem aspectos bastante positivos, porque traz consigo metas de eficiência energética que devem ser consideradas pelas indústrias em seu planejamento de tecnologia e produtos.”
Postura brasileira no processo de descarbonização
Uma pesquisa lançada em março pela LCA Consultores e MTempo Capital analisou três cenários para o contexto brasileiro de descarbonização e transição energética. O primeiro deles seria uma situação sem mudanças tecnológicas, enquanto o segundo e o terceiro teriam uma predominância de veículos híbridos e totalmente elétricos, respectivamente.
O estudo mostra que os híbridos têm um desempenho melhor no contexto brasileiro em termos de produção e impacto econômico. Os resultados apontam para um aumento no PIB, na arrecadação de impostos, e na geração de emprego e renda no país. A projeção é de que o país obtenha ganhos de R$ 2,8 trilhões no PIB e R$ 1,6 milhão na geração de empregos, em relação ao cenário dos veículos 100% elétricos. Braun, no entanto, reforça que essa tendência não anula a utilização de outras rotas sustentáveis.
Diferença da realidade brasileira para a de outros países
O mercado de elétricos tem crescido em todo o mundo. Segundo relatório publicado pelo Rocky Mountain Institute, até 2030, os veículos elétricos representarão entre 62% e 86% das vendas globais – caso a tendência permaneça em ascensão e desafios no setor sejam superados.
“Mas não necessariamente precisamos copiar as estratégias de descarbonização que estão sendo utilizadas em países desenvolvidos”, explica o membro do MBCB. Ele aponta que existe um contexto de infraestrutura e renda diferente do nosso. “Além disso, somos um país de dimensões continentais, de grandes distâncias entre as cidades e estados.”
Por outro lado, o Brasil tem a oportunidade de investir nos biocombustíveis, como o etanol, por exemplo, que pode ser produzido a partir da cana-de-açucar e outras plantas ou raízes. Uma característica que, segundo Braun, pode ser vista como uma vantagem. “Eles [países desenvolvidos] não têm uma produção de biocombustíveis como nós temos em nosso território”, enfatiza.
A Índia, segunda maior produtora de cana-de-açúcar do mundo, somente atrás do Brasil, encontrou no modelo brasileiro uma referência para atingir suas metas de energias renováveis. O país tem como objetivo chegar a 20% de mistura de etanol à gasolina até 2025. “Os biocombustíveis favorecem a descarbonização porque você tem uma absorção do CO? no momento do plantio dessas culturas, como a cana”, diz o diretor.
Dificuldades dos veículos 100% elétricos
Infraestrutura – No Brasil, existem cerca de 4.600 postos de recarga de veículos elétricos. O estado de São Paulo, sozinho, concentra quase 1/3 deles. “O que a gente vê hoje é uma concentração muito grande de pontos de recarga em alguns locais. Isso cria uma dificuldade, já que a pessoa precisa da infraestrutura para poder fazer a sua jornada”, aponta Braun. De acordo com o EV Charging Index, índice global de infraestrutura para carros elétricos, o Brasil ocupa a 20ª posição na lista de 30 países.
Longas distâncias e bateria – Por conta da condição de autonomia das baterias e da infraestrutura de recarga, o veículo elétrico é mais adequado para trajetos urbanos. “Para um deslocamento um pouco mais extenso, você necessitaria ter uma infraestrutura de recarga ou mesmo autonomia maior das baterias”, explica o membro do conselho. Ele ainda diz que essas tecnologias estão sendo estudadas para que se desenvolvam de acordo com o crescimento do mercado de elétricos.
Embora o país pareça caminhar para a utilização de híbridos e biocombustíveis, o diretor reforça que todas as rotas tecnológicas são importantes e vão coexistir. “Elas trazem contribuições e também desafios. Precisamos pensar de forma ampla, do ponto de vista ambiental, claro, mas também do social e econômico, sempre priorizando o que é melhor para o país.”
Fonte: ig
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