A autorização para importação de biodiesel, que pode ser revista pelo governo na reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), no dia 18, não tem potencial de inundar o mercado interno, mas já pode segurar novos investimentos na indústria, segundo empresas do setor consultadas pelo Valor.
Erasmo Carlos Batistella, dono da Be8 (ex-BSBIOS), que é uma das maiores empresas de biodiesel do país, diz que, se a permissão para a importação for mantida, “certamente vamos ter retração nos investimentos”.
Neste ano, a companhia investiu no aumento da capacidade de seu complexo industrial em Marialva (PR). Em junho, a Be8 anunciou aporte de até R$ 1,5 bilhão para erguer esmagadora de soja ao lado da planta de biodiesel, após concluir a sexta ampliação da usina, agora com capacidade para fabricar 540 milhões de litros ao ano.
Além disso, a Be8 está para dar o pontapé em um segundo investimento para elevar a capacidade da usina de Passo Fundo (RS). Esse aporte tem como objetivo de atender à mistura obrigatória de 14% e 15%, afirma Batistella.
A Olfar, que tem três usinas no país, também vê com receio a autorização para importações. Mateus Andrich, diretor industrial, afirma que a companhia não prevê agora investimentos em aumento da indústria porque ainda tem 40% de sua capacidade total ociosa.
Já na Binatural, os investimentos continuam. Nos últimos três anos, desembolsou R$ 115 milhões em seu complexo industrial na Bahia e R$ 32 milhões no de Goiás. Para os próximos três anos, mais R$ 100 milhões serão aplicados, diz o CEO André Lavor. “A importação não prejudica os planos de investimento da Binatural. Manteremos nosso compromisso com o planejamento estabelecido para atender à demanda.” Na avaliação do executivo, o biodiesel brasileiro tem qualidade superior ao de fora, além de favorecer os pequenos produtores.
Há uma limitação regulatória às importações, pois a Agência nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) restringiu a importação aos 20% que os distribuidores não precisam comprar de biodiesel produzido a partir do Selo Biocombustível Social, com matéria-prima da agricultura familiar.
Há ainda uma barreira mercadológica, ao menos no curto prazo. O biodiesel produzido em outros países não chega hoje ao Brasil a preços competitivos. O ofertante com maior potencial no mercado é a Argentina. Mas dados da S&P Global mostram que, hoje, o produto do país vizinho consegue chegar nos portos argentinos a US$ 920 a tonelada, enquanto o brasileiro chega nos portos nacionais a US$ 1.026.
Apesar de ser US$ 100 mais barato, o produto argentino ainda teria que pagar o custo de nacionalização, incluindo frete, anulando a diferença, diz Nicolle Monteiro de Castro, especialista em biocombustíveis da S&P Global.
Mesmo no Nordeste, região deficitária em biocombustíveis, o biodiesel argentino não consegue competir hoje. O valor do produto no porto de Rosário, na Argentina, está o equivalente a R$ 4,70 o litro (FOB), enquanto o de um contrato recente de venda de biodiesel no mercado físico (spot) do Nordeste monitorado pela S&P Global ficou em R$ 4,77 o litro. Sobre o valor do produto argentino, porém, ainda incidiriam os custos de nacionalização e de frete para o Nordeste, mais caro que para o Centro-Sul, observa Castro. “Hoje a arbitragem está fechada. Não tem sentido econômico importar”.
O receio da indústria é que uma abertura da janela force os preços nacionais para baixo. Além disso, o setor já convive com capacidade ociosa. A ociosidade está em 51%, pois a produção deste ano deve ficar em 7,3 bilhões de litros, segundo a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), e a capacidade autorizada pela ANP é de 14,3 bilhões de litros ao ano. Segundo representantes da indústria, as usinas já conseguiriam atender o B20, dada a demanda atual.
A mistura obrigatória está em 12%, e o cronograma prevê aumento para 13% em março, mas o CNPE pode votar a antecipação do B14 para o ano que vem.
As distribuidoras e importadoras de combustíveis são contrárias à reversão da autorização para as importações. Ontem, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) divulgou nota com outras associações do segmento afirmando que a regulamentação da importação seguiu rito de análise de impacto e de consulta à sociedade. E afirmou que “alterações extemporâneas numa pauta longamente debatida com a sociedade comprometem a estabilidade regulatória e geram insegurança no mercado”.
Fonte: Globo Rural
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