Artigo de opinião de Renato Buranello, advogado e presidente do Instituto Brasileiro do Direito do Agronegócio (IBDA)
O desempenho espetacular do agronegócio brasileiro não é produto nem de sorte, nem de acaso. É resultado de muito trabalho, de ações de instituições públicas e privadas, no uso racional de recursos naturais, da disponibilidade de terra arável e de água, da ciência e tecnologia aplicada ao campo, do monitoramento e controle de doenças e pragas e da promoção de produtos no mercado internacional. O setor é o único a manter uma trajetória positiva ao longo das últimas décadas.
Temos um protagonismo global explicado pela demanda de alimentos no mundo. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a oferta de alimentos precisa crescer 3,8% ao ano para atender ao aumento da população mundial, que chega a 8 bilhões em 2024 e a quase 10 bilhões em 2050, e o Brasil lidera as posições de crescimento entre as principais nações agrícolas. Nesse cenário contínuo de evolução, a matriz será a bioeconomia.
A bioeconomia é um modelo de produção industrial baseado no uso de recursos biológicos. O objetivo é oferecer soluções para a sustentabilidade dos sistemas de produção com vistas à substituição de recursos fósseis e não renováveis. Abre múltiplas oportunidades para o agronegócio na elevada capacidade que as cadeias de produção agroindustriais têm de acessar recursos naturais com eficiência. Isso pode inserir o País em contextos industriais sofisticados nos setores de fibras e bioenergia, aqui, em especial, a sinergia com a economia do hidrogênio a partir da biomassa.
Uma política ambiental como estratégia nacional poderá levar o Brasil à posição de protagonista no destino do planeta. Ainda nesta década, os impactos sociais e ambientais serão tão transparentes quanto os relatórios financeiros no âmbito de mercado, é o que afirma o professor da Harvard Business School George Serafeim. E isso não será diferente àqueles que atuam nas cadeias agroindustriais. Para chegar a esse patamar será preciso investir em dados, métricas de desempenho e capacitação de profissionais.
A descarbonização está no topo das prioridades dos países, com impacto nas políticas internacionais e distorções econômicas no fluxo comercial. Nesse contexto vemos incentivos (subsídios) econômicos americanos e um lado punitivo europeu. Não há um foro regulatório global, a Organização Mundial do Comércio (OMC) não está em condições de fazer isso, nem mesmo a própria Conferência do Clima da ONU (COP). Nas palavras do embaixador Roberto Azevedo, o maior risco é o Brasil ficar fora das decisões sob um “manto de legitimidade” dos países do velho mundo. Nada ocorrerá por acaso, e dentro das narrativas não adianta só se sentir injustiçado. Para José Eli da Veiga, professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (EA/USP), a melhor maneira de precificar o carbono – a tributação – sequer faz parte das negociações.
Os alimentos também se tornaram um ponto central nas preocupações com as disputas Estados Unidos-China e a desglobalização mais ampla das cadeias de fornecimento. Países europeus como Itália e França estão duplicando as proteções aos produtores locais. Nos Estados Unidos, há apelos de apoio à agricultura local e aos pequenos produtores locais, não só por razões de saúde e segurança nacional, mas também por questões econômicas.
Há um diagnóstico bastante difundido de que a maior integração no comércio internacional é condição necessária para o aumento da eficiência e competitividade de nossa economia. Contudo, na consolidação do “século asiático”, precisamos indagar qual direção deve ser dada à nossa diplomacia. Qual tipo de inserção internacional desejamos construir para o Brasil? Falta-nos, talvez, “simplesmente” a determinação coletiva política, uma visão estratégica de fazer desse patrimônio um ativo interno que nos articule como força na ordem global.
O conceituado Serviço de Pesquisas Econômicas do Ministério da Agricultura dos Estados Unidos (ERS/USDA, International Agricultural Productivity, setembro de 2023) publicou pesquisa na qual projeta para a safra 2027/2028 os limites de expansão de área agrícola mundial de grãos – milho, sorgo, cevada, trigo, arroz, algodão, soja e girassol –, que representam 75% da área total. Dentre os mais importantes celeiros mundiais, os Estados Unidos, União Europeia e China esgotaram verticalmente seus espaços – crescimento menor que 1% nos dez anos entre 2017 e 2027. A Índia logrará 6% (mais 8 milhões de hectares) e o Brasil será o único com potencial expansivo importante, com 21% de crescimento projetado (mais de 15 milhões de hectares). Conseguimos assegurar que, no Brasil, as “áreas novas” para produção agrícola virão menos de aberturas de novas áreas e mais de outras fontes: substituição de pastagens degradadas; Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF); aumento de produtividade (tecnologia agrícola); e emprego de irrigação.
Ao ampliar a visão para além dos tradicionais pilares produtivos, reconhecendo o valor dos ativos naturais, o agronegócio não apenas se fortalecerá frente aos desafios mais imediatos, mas também se posicionará como agente fundamental na construção de um futuro sustentável e resiliente, alinhado com as expectativas de uma sociedade comprometida com a preservação do meio ambiente.
Fonte: Estadão
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