Permanecer competitivo é necessário para vencer disputas comerciais e, atualmente, essa permanência requer cuidados mais diversificados, em especial os relacionados à sustentabilidade, que inclui uma forte agenda ESG – sigla em inglês para ações de cunho ambiental, social e de governança.
Nesse sentido, iniciativas públicas e privadas buscam parcerias e trocas para lidar com desafios que parecem inerentes à atualidade, como mudanças climáticas, escassez de recursos naturais, transição energética e descarbonização. Estes dois últimos, aliás,
têm ganhado espaço na agenda do setor portuário brasileiro.
Para fomentar essas ações, o Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) lançou, no final de janeiro deste ano, a nova Política de Sustentabilidade e o Pacto pela Sustentabilidade. Além de dar diretrizes e estabelecer metas gerais, o projeto reconhecerá empresas que adotam práticas sustentáveis, por meio da concessão de selos.
“Temos trabalhado na implementação, incentivando a modernização e a adoção de práticas sustentáveis nos portos.
A digitalização, a transição energética e o incentivo a soluções de baixo carbono são prioridades para o setor, garantindo maior eficiência operacional e alinhamento com as diretrizes globais de sustentabilidade”, afirmou a pasta.
Em outubro de 2024, o MPor também participou de um webinário internacional sobre experiências inovadoras e sustentáveis nos portos de Roterdã (Holanda) e Antuérpia (Bélgica). Segundo a pasta, foi possível identificar diversos projetos que podem ser replicados no Brasil, com destaque para duas vertentes.
A primeira diz respeito ao uso de energias renováveis e combustíveis alternativos. O terminal holandês, por exemplo, está investindo em infraestrutura para bunkering (fornecimento) de amônia, enquanto o belga desenvolveu soluções para integrar a energia eólica offshore nas próprias operações.
Já a segunda vertente está relacionada à logística verde e à multimodalidade, visto que ambos os portos têm investido para reduzir a dependência do transporte rodoviário e promover uma maior integração com ferrovias e hidrovias, a fim de reduzir as emissões de carbono na atmosfera.
“No Brasil, a utilização de combustíveis sustentáveis, como hidrogênio e biocombustíveis, está sendo incentivada dentro da agenda climática do setor portuário. Ao mesmo tempo, o incentivo ao uso do transporte ferroviário e a ampliação da multimodalidade são prioridades para tornar os portos mais sustentáveis e eficientes”, destacou o MPor.
Todo esse movimento, típico de uma economia mais globalizada, tecnológica e preocupada com o meio ambiente, pode ser ilustrado por números. De acordo com uma pesquisa feita pela Diretoria de Sustentabilidade do MPor, só em 2023 o setor portuário brasileiro investiu mais de R$ 170 milhões em iniciativas ambientais, com foco em sustentabilidade e inovação.
No Espírito Santo, investimentos pesados têm sido feitos, por exemplo, no porto da Imetame, cuja inauguração está prevista para o segundo semestre de 2026, mas que já deve fazer operações-testes a partir do final deste ano. Localizado em Aracruz, no norte do estado, o complexo está sendo construído com um olhar no futuro.
Diretor de Operações da Imetame Logística Porto, Anderson Carvalho explica que o projeto estabelece, por exemplo, a utilização de guindastes de cais (STS cranes) e de pátio (RTG cranes) totalmente eletrificados. Assim como os pórticos para movimentação de embarque e descarga de contêineres, que também serão elétricos.
“Apenas para o início da nossa operação é que teremos alguns equipamentos a combustão, mas toda a nossa estrutura estará preparada para fazer essa transição, para usar apenas os eletrificados, a curto e médio prazos”, disse. Segundo ele, o aporte em tecnologia, inovação e sustentabilidade supera R$ 1 bilhão.
Além dos equipamentos eletrificados, o porto da Imetame terá infraestrutura para fornecer energia de terra aos navios, permitindo que estes possam desligar os motores – movidos a combustíveis fósseis – enquanto estiverem atracados. Painéis solares também serão instalados em telhados para a geração de energia sustentável.
Tudo isso contribui para alcançar a meta de zerar as emissões de gases de efeito estufa até 2050, como parte de uma estratégia global lançada pela Organização Marítima Internacional (IMO), a agência da ONU que regula o transporte marítimo mundial. Um objetivo que Anderson vê como uma “obrigação” e um “grande desafio”.
Outra iniciativa sustentável destacada por ele é o futuro sistema de captação e armazenamento da água da chuva, que possibilitará usá-la em processos que não precisam de água potável. É o caso, por exemplo, da rega de plantas, da lavagem de áreas e da manutenção ou limpeza de equipamentos.
Na Região Metropolitana, um dos destaques é o Porto de Vitória, sob concessão da Vports há quase três anos. O trabalho desenvolvido no âmbito da sustentabilidade resultou em 2,5 pontos a mais no Índice de Desempenho Ambiental da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), na comparação entre 2022 e 2023.
O resultado reflete o enfoque dado desde o início da privatização do ativo público, de acordo com Camilla Bridi, gerente de Sustentabilidade da empresa. “Eu acho que o melhor aproveitamento de um porto com capacidade ociosa, que já gerou impactos, é um movimento que também deve ser observado sob essa ótica sustentável”.
Nos primeiros dois anos da concessão, a Vports investiu cerca de R$ 180 milhões em obras de infraestrutura e modernização, o que resultou em mais de 5.700 toneladas de resíduos da construção civil reciclados – uma iniciativa ligada a um ponto considerado estratégico pela empresa, que é reduzir os próprios impactos.
Segundo Camilla, tal postura inclui: planos de contingência e simulados para possíveis casos de derramamento de óleo, a gestão de resíduos e a descarbonização. Além da relação porto-cidade, na qual a administração portuária busca minimizar consequências negativas, como trânsito e barulho, ao mesmo tempo em que promove benfeitorias.
“Há alguns aspectos de convivência, como a produção de lixo e o fluxo de caminhões que vêm para o porto, por isso buscamos uma comunicação contínua com a comunidade. Por outro lado, o porto é desenvolvimento e geração de emprego, e por esta razão fizemos um movimento, no ano passado, de tentar atrair mão de obra local”, disse.
Ações em prol da educação e da cultura também entram nesse contexto. Cinco armazéns antigos do Centro da capital foram recuperados. Dois serão usados para fins comerciais, um ficará à disposição da Secretaria Estadual de Cultura, outro será a sede do Senai Porto – um centro de formação de mão de obra especializada – e o último abrigará o Museu Vale.
A preservação do ambiente marinho não poderia ficar de fora das preocupações ambientais, por motivos óbvios. Em relação aos impactos da atividade portuária na fauna e na flora, o Iema (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos) destaca três no Espírito Santo: a emissão de material particulado; a introdução de espécies exóticas, por vezes aderidas a cascos de embarcações; e a interferência na linha de costa.
“Por isso, são necessários controles ambientais e o estabelecimento de condições para mitigá-los. O acompanhamento contínuo das condicionantes ambientais e as ações fiscalizatórias são instrumentos que permitem entender as relações entre a operação e os seus efeitos no meio ambiente”, disse o órgão.
Nesse sentido, ainda na fase de construção, o porto da Imetame deu início ao monitoramento contínuo da qualidade da água, entre outros indicadores, a fim de garantir uma operação harmônica com o meio ambiente. Um banco de dados será gerado e ficará à disposição de órgãos reguladores e da sociedade civil.
Já o Porto de Vitória, por exemplo, faz o acompanhamento de todas as atividades de dragagem e mantém um acordo de cooperação técnica com o Instituto Baleia Jubarte, para proteger tais animais. Um dos objetivos da Vports é alcançar o certificado de “guardiã das baleias”, junto à organização Great Whale Conservancy.
A parceria produziu um manual com orientações aos navegantes. Entre elas, está evitar a navegação noturna e reduzir a velocidade na área ao redor do porto.
O sistema de informações do porto (VTMIS) também fica disponível para o monitoramento das baleias, a partir de câmeras instaladas em pontos estratégicos.
Para os próximos anos, a expectativa é que o porto da Imetame expanda o volume de carga movimentada enquanto adota mais tecnologias verdes, de forma a se tornar mais eficiente e atraente. “A sustentabilidade vem, cada dia mais, tornando-se também uma demanda de clientes e operadores”, destacou Anderson Carvalho.
Em paralelo, o Porto de Vitória pretende investir em quatro pontos principais da agenda ESG: fornecimento de energia de terra para os navios, gestão de recursos naturais (atingindo metas estabelecidas para o consumo de água, por exemplo), descarbonização e relação porto-cidade.
“Ter preocupações como as nossas já torna o negócio mais competitivo, o que é fundamental para o estado.
Outro aspecto relevante está relacionado à capacidade de atrair negócios mais aderentes a uma economia mais limpa, como carros elétricos e lítio verde. Hoje, os negócios precisam ser sustentáveis e resilientes”, concluiu Camilla Bridi.
Fonte: ES Brasil