Em seu último Plano Safra à frente do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), antes de sair do governo para disputar as eleições de 2022, a ministra Tereza Cristina mostrou o tamanho do seu prestígio em Brasília. Mesmo diante de um orçamento federal que nasceu com déficit de US$ 247,1 bilhões, a dona da Pasta conseguiu um incremento de R$ 13 bilhões para a temporada 2021/22 em relação ao orçamento anterior, chegando a R$ 251,2 bilhões. O volume, porém, ficou aquém do pleito da ministra. Frustração que ela evidenciou em alto e bom som, durante a cerimônia de divulgação do pacote. “Eu gostaria que tivesse sido R$ 15 bilhões”, afirmou Tereza Cristina, dirigindo-se nominalmente ao ministro Paulo Guedes (Economia) durante seu discurso.
Do total de recursos, o valor das taxas controladas é de R$ 165,2 bilhões
Apesar da clareza de que os recursos serão insuficientes para cobrir a demanda do setor que deve alcançar R$ 1,19 trilhão em Valor Bruto de Produção em 2021, de maneira geral o resultado foi aceito com compreensão pelo mercado. Para o diretor de Agronegócio do Itaú BBA, Pedro Fernandes, “foi o plano possível”. Para ele, o pacote trouxe reflexos do meio externo, “notadamente do aumento do preço dos financiamentos”, disse à RURAL. Do total anunciado, R$ 86 bilhões serão a juros livres e R$ 165,2 bilhões com taxas controladas. Todas as linhas oficiais, porém, ficaram mais caras, com juros que variam da máxima de 8,5% para o Moderfrota a 4% e 3% para o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). A base anterior variava de 2,75 a 6%.
CUSTO
O aumento das taxas, como era de se esperar, desagradou. A luta da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) era para que as mesmas taxas dos anos anteriores fossem mantidas. Não funcionou. A entidade decidiu então mirar em outra ponta para aliviar o custo ao produtor, conforme disse o diretor técnico Bruno Lucchi. “A CNA tem trabalhado para reduzir os custos cartoriais, administrativos e tributários, além das taxas e spreads bancários”. Segundo o executivo, ao somar os custos periféricos a taxa final de crédito paga pelo produtor familiar pula de 4% para 14%. Diante da realidade, Mauricio de Moura, diretor corporativo de Agronegócio da Becomex, alerta para as consequências. “O produtor terá que encontrar alternativas para cobrir esse aumento de custos, uma vez que o mercado internacional não pagará o reajuste”, afirmou.
Na divisão do bolo de R$ 251,2 bilhões, o custeio ficou com R$ 177,8 bilhões. Os demais R$ 73,4 bilhões foram para investimento. A alta de 29% em relação à safra anterior agradou o diretor Comercial e de Canais do Sistema de Cooperativas de Crédito (Sicoob), Francisco Reposse Junior, tanto pelo volume como pelas novas oportunidades de destinação dos recursos. “Ficamos muito felizes com a possibilidade de novos financiamentos, como de galpões e estruturas para confinamento, já que havia uma demanda grande para isso”, disse. Para agradar aos demandantes, o Mapa separou R$ 4,12 bilhões para o Plano de Construção de Armazéns. O volume supera em 84% o da safra anterior e, segundo o ministério, será o suficiente para aumentar em até 5 milhões de toneladas a capacidade instalada. O crescimento em percentual dos recursos destinados à armazenagem só perde para um programa: o ABC, ou Agricultura de Baixo Carbono, que teve o valor duplicado.
BIOECONOMIA
“Este Plano vem pincelado de verde”, disse a ministra ao anunciar que o programa ABC receberia o valor recorde de R$ 5 bilhões. Aqui também há novas possibilidades de destinação do capital que poderá ser usado para financiar unidades de produção de bioinsumos e biofertilizantes; sistemas de geração de energia renovável; e geração de energia elétrica a partir de biogás e biometano. Dentro do Pronaf, que receberá R$ 39,3 bilhões, também será possível aplicar o dinheiro em sistemas agroflorestais e turismo rural. Para Pedro Fernandes, do Itaú BBA, o posicionamento do Mapa na agenda tem um efeito bastante positivo. “O nosso crédito rural já é muito verde, o que a ministra possibilita com este plano é que comuniquemos isso melhor”, afirmou.
Vale destacar que as palavras da ministra mostravam um governo – a bem da verdade, um ministério – mais alinhado ao discurso global em direção às boas práticas ambientais. Isso até o presidente Jair Bolsonaro assumir o púlpito. Ao abordar o tema, o chefe de Estado se dirigiu ao então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (sentado na plateia e exonerado um dia após a cerimônia), para parabenizá-lo pelo “casamento perfeito”, segundo suas palavras, entre as pastas do Ambiente e da Agricultura. Como é de seu feitio, esqueceu que o agronegócio é o setor que mais sofre com a pressão de ser acusado de sucessivos recordes de desmatamento da Amazônia, reputação que deve ser agravada com a temporada de incêndios que começou em maio e se alastrará até setembro.
SEGURO E PERSPECTIVA
E por falar em frustrações, a má notícia sobrou para o Seguro Rural. Visto pelo mercado como uma alternativa à inexorável tendência de redução dos recursos equalizados nos próximos anos, o PSR ficou com R$ 1 bilhão, contra os anteriores R$ 948,1 milhões. Um banho de água fria para o Sicoob. “Gostaria de ver mais subsídios a esse financiamento pois, quanto mais seguradas as nossas lavouras e propriedades são, menor o risco ao produtor”, afirmou Reposse Junior. Hoje menos de 20% da área agricultável do País têm algum tipo de seguro. Com o volume subsidiado, o aumento da área será irrelevante, de 10,1 milhões para 10,7 milhões de hectares. Diante da comunicação dos números, Tereza Cristina voltou a provocar Guedes. “Ainda não estou conformada com esse seguro, olha os números que estamos mostrando [disse em referência aos resultados do agronegócio]. Precisamos avançar”, disse a ministra.
No fim das contas, o Plano Safra 2021/2022 veio melhor do que o cenário de aperto orçamentário indicava, e menor do que o campo vai demandar. Como toda notícia, essa também tem dois lados e reforça a oportunidade dos bancos privados avançarem a participação do agro em suas carteiras. Caso do Itaú BBA, que vê também a oportunidade de crescer em seu posicionamento ESG. “Os investimentos eram essencialmente concentrados no BNDES e agora os bancos poderão utilizar parte de sua exigibilidade para investimento, notadamente no programa ABC”, afirmou Fernandes.
Da parte de quem toma o crédito, porém, um medo permanece intocado. Ao menos para João Roberto Gasparini, diretor vice-presidente da Cooperativa de Produtores Rurais de Agricultura Familiar (Coperfam). “É grande a preocupação se esse recurso chegará em tempo hábil nas mãos dos agricultores”, disse. Afinal, em duas frentes o Plano Safra não chega: nem na burocracia nem no relógio. “No campo não se compra hoje para plantar amanhã, é necessário tempo”, afirmou.
Fonte: Dinheiro Rural
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