Reintroduzir espécies extintas ou ameaçadas, reduzir consumo de água e de emissão de poluentes, ter fornecedores livres de desmatamentos e frota de veículos com combustíveis limpos são alguns dos compromissos estabelecidos por companhias brasileiras em recentes emissões de bônus e têm atraído demandas acima da oferta.
Além dos “green bonds”, ou títulos verdes, começam a aparecer no mercado os chamados SLB (títulos de dívidas atrelados a metas de sustentabilidade), que preveem penalidade à empresa que não cumprir o prometido no prazo com acréscimo na remuneração aos investidores. Papéis com esse compromisso têm sido muito atrativos, especialmente no mercado internacional.
Nas emissões feitas do fim de 2020 para cá, a demanda foi até dez vezes maior do que a oferta para esse tipo de título sustentável. Com maior procura os juros são inferiores aos de emissões convencionais. O diretor de Relações com Investidores da Simpar, Denys Marc Ferrez, acredita que há mais disponibilidade de recursos do que negócios com emissões dessa natureza por ser algo ainda uma novidade. “Hoje tem mais dinheiro com esse viés do que oferta de ativos”, diz.
A Simpar - holding que controla seis empresas, entre as quais JSL, Original e Movida -, realizou no mês passado uma emissão internacional em reais de R$ 450 milhões. Segundo Ferrez, foi uma demanda específica pensando em três investidores, mas 12 foram atraídos e não deu para atender a todos.
A empresa assumiu compromisso de reduzir em 7,8% a emissão de gases de efeito estufa em suas operações até 2025. Uma das ações será a substituição da frota de caminhões a diesel para elétricos ou que usem combustíveis mais limpos. Em janeiro o grupo já tinha feito uma captação internacional com selo sustentável em dólar. A oferta inicial era de US$ 500 milhões e teve demanda cinco vezes maior, o que levou o grupo a ampliá-la para US$ 625 milhões e ratear o valor com juros mais baixos.
Para Gustavo Siqueira, do Morgan Stanley, “os produtos disponíveis atualmente versus a quantidade de dinheiro investido em fundos ESG (ambiental, social e governança) é claramente desbalanceada”. Em sua opinião, a maioria dos grandes gestores de dinheiro no mundo estão convergindo para uma preocupação com o meio ambiente. “Eles perceberam que principalmente a população mais jovem, os millennials que estão assumindo os negócios se importam em obter retorno com o dinheiro aplicado, mas usado de maneira mais consciente”.
É com esse pensamento que tem crescido a emissão de bônus sustentáveis pelas empresas mais fortemente na Europa e EUA, e mais recentemente no Brasil. Relatório do Santander com base em dados da plataforma Sitawi indicam que as emissões de títulos com viés ESG somaram US$ 5,3 bilhões em 2020 - o dobro do ano anterior - e, só nos dois primeiros meses deste ano já estão em US$ 5 bilhões.
Parte desse resultado veio da Klabin que, em janeiro, fez emissões de títulos de dívida (SLB) de US$ 500 milhões, mas a demanda foi dez vezes superior. “Outras emissões da empresa também tiveram demanda forte, mas, nesse caso, certamente foi maior por causa dos compromissos verdes”, diz Gustavo Rocha Garcia, gerente de Tesouraria. “E foi isso que permitiu que conseguíssemos espremer tanto a taxa, para 3,2% ao ano pois, se não fosse verde provavelmente seria 3,6%.”
As metas estabelecidas pela Klabin são de redução do consumo de água no processo produtivo, aumento de reutilização e reciclagem de resíduos sólidos e a reintrodução de duas espécies extintas ou ameaçadas de extinção em áreas florestais da empresa até 2025.
Apesar de o mercado de capitais brasileiro ainda estar pouco amadurecido, Garcia acredita que a “percepção verde é um caminho sem volta”. Para ele, a emissão da Klabin ajudará a mostrar que as empresas podem inclusive perder vantagem competitiva. “Antes não era fácil encontrar um benefício financeiro (nesse tipo de operação) e agora tem; por isso acredito que vai existir uma força maior para que as empresas criem compromissos sustentáveis.”
Em setembro a Suzano emitiu US$ 750 milhões em bônus atrelados a metas de sustentabilidade e também teve demanda dez vezes superior. Diante da oportunidade, a empresa reabriu a emissão dois meses depois e captou mais US$ 500 milhões - e demanda quatro vezes maior -, com um diferencial: os juros pelo SLE ficaram em 3,1% ao ano, a menor taxa para uma empresa brasileira em emissões semelhantes. Na anterior, a taxa foi de 3,95%.
Mais oportunidades
“O mercado está muito demandante de papéis com características desse tipo e a oferta ainda não dá conta, então é uma oportunidade muito grande”, afirma Marcelo Bacci, diretor de finanças e de relações com investidores da Suzano. “Há cinco anos não tínhamos nenhuma transação feita dessa forma e hoje 30% da nossa dívida já é ligada a metas de sustentabilidade”.
Segundo Bacci, a tendência é de crescimento desse tipo de transação no Brasil e no mundo, o que é bom para que se possa premiar com custos de capital menor as empresas com iniciativas sociais e ambientais. As metas da Suzano atreladas ao empréstimo são a redução de emissões de gases de efeito estufa e de captação industrial de água.
A Rumo também realizou emissões nos últimos meses com foco ESG a Rumo, de US$ 500 milhões e demanda quase cinco vezes maior. A empresa se comprometeu a direcionar os recursos captados para o financiamento de “projetos verdes” como substituição e aquisição de material rodante mais moderno e extensão e modernização das vias férreas, além de reduzir em 15% emissões específicas até 2025.
Já a FS, usina de etanol que utiliza milho em 100% de sua produção, captou em janeiro US$ 50 milhões em uma emissão complementar em títulos verdes que teve procura por US$ 300 milhões. Em dezembro, o grupo já tinha feito outra oferta de US$ 550 milhões, elevando então o montante para US$ 600 milhões.
Segundo o grupo, as metas estabelecidas foram manter-se no ranking das top 10 de etanol anidro do RenovaBio, aumentar a transparência na divulgação de informações e certificação da emissão com base nos padrões do CBI - Climate Bonds Initiative, organismo que faz certificações de títulos voltados ao ESG.
Fonte: Estadão
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