Um novo estudo do The Lancet Countdown, liderado pelo University College em Londres, divulgado nesta semana, apresenta projeções alarmantes sobre os riscos para a saúde gerados pelas mudanças climáticas e o impacto que elas podem ter na sobrevivência de bilhões de pessoas ao redor do globo nos próximos anos.
Uma das mais impressionantes, segundo o relatório elaborado por 114 especialistas de 52 instituições de pesquisa e agências da ONU, incluindo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Meteorológica Mundial (OMM), é que o mundo deve atingir 2,7 °C de aquecimento até 2100, com as emissões relacionadas à energia atingindo um novo recorde em 2022, o que significa um enorme risco à vida das gerações atuais e futuras.
O trabalho também evidencia projeções desenvolvidas com o apoio do Climate Vulnerability Forum (CVF) que descrevem os riscos crescentes para a saúde da população se a meta de 1,5 °C de aquecimento não for atingida, podendo chegar a 2°C até o final do século. Nesse cenário, as mortes anuais relacionadas ao calor podem aumentar em 370% até meados do século, e essas ondas de calor, como as que assolam o Brasil na última semana, serão mais frequentes, podendo levar cerca de 525 milhões a mais de pessoas para situações como a de insegurança alimentar moderada a grave até o período de 2041 a 2060, fazendo crescer exponencialmente o risco global de desnutrição.
Outro problema que pode se agravar é o aumento de doenças infecciosas que causam risco de vida, com o potencial de transmissão da dengue, por exemplo, aumentando entre 36% e 37%.
“Nosso balanço sobre a saúde revela que os riscos crescentes das mudanças climáticas estão custando, hoje, vidas e meios de subsistência em todo o mundo”, afirma Marina Romanello, diretora-executiva da Lancet Countdown, que produziu o relatório, na University College de Londres. “As projeções de um mundo 2 °C mais quente revelam um futuro perigoso e são um lembrete de que o ritmo e a escala dos esforços de mitigação vistos até agora têm sido lamentavelmente inadequados para proteger a saúde e a segurança das pessoas”, completa.
Segundo a especialista, com 1.337 toneladas de dióxido de carbono ainda sendo emitidas a cada segundo, não se consegue reduzir as emissões com rapidez suficiente para manter os riscos climáticos dentro dos níveis com os quais os sistemas de saúde são capazes de lidar. Assim, um imenso custo humano é gerado pela inação. “Não podemos arcar com esse nível de falta de comprometimento: estamos pagando com vidas humanas. Cada instante que nós postergamos torna o caminho para um futuro habitável mais difícil e a adaptação cada vez mais cara e desafiadora”, alerta Marina.
Ainda há Esperança
Ainda de acordo com a diretora do Lancet Countdown, o foco em saúde na COP28 será garantir compromissos e ações nesse quesito. “Se as negociações climáticas levarem a uma eliminação rápida e equitativa dos combustíveis fósseis, acelerarem a mitigação, e derem apoio aos esforços de adaptação para a saúde, as ambições do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5 °C ainda são atingíveis e um futuro próspero e saudável está ao nosso alcance”, diz Marina.
Mesmo com tantos desafios, no entanto, o relatório também descreve benefícios para a saúde que podem vir de uma transição centrada na saúde, focando em um futuro de carbono zero com a transição acelerada para energias limpas e a eficiência energética em países de renda baixa. Essas ações, segundo o trabalho, trariam benefícios imediatos, reduzindo as desigualdades socioeconômicas e de saúde, desenvolvendo habilidades locais, gerando empregos, apoiando as economias locais e fornecendo energia para áreas fora da rede elétrica.
“Eletrificando casas e instalações de saúde, particularmente em áreas onde a pobreza energética ainda prejudica a saúde e o bemestar das pessoas”, diz Ian Hamilton, líder do Grupo de Trabalho da Lancet Countdown em Ações de Mitigação e Benefícios Conjuntos de Saúde.
Melhorias na qualidade do ar também evitariam muitas das 1,9 milhão de mortes anuais por consequência da poluição, taxa que caiu quase 16% desde 2005, graças à redução da poluição causada pela queima de combustíveis fósseis. Na alimentação, a transição para alimentos mais saudáveis e com baixo teor de carbono pode prevenir até 12 milhões de mortes por alimentação precária. Esses ganhos também tornariam as populações mais saudáveis, reduzindo assim as pressões sobre os sistemas de saúde.
“Embora a ambição de canalizar dinheiro para a adaptação seja fundamental, a ação centrada na saúde requer uma mitigação urgente. E isso demandará defender a saúde das pessoas dos interesses das indústrias de combustíveis fósseis e outras indústrias prejudiciais à saúde. É necessária uma ação climática transformadora hoje para permitir um futuro em que as gerações presentes e futuras possam prosperar”, afirma Anthony Costello, copresidente da Lancet Countdown.
Até agora…
Em 2023, o planeta registrou as temperaturas mais quentes em mais de 100.000 anos e recordes de calor foram quebrados em todos os continentes, expondo as pessoas em todo o mundo a graves riscos.
Entre 2018 e 2022, foram, em média, 86 dias de altas temperaturas que ameaçam a saúde, sendo que mais de 60% desses dias eram pelas mudanças climáticas provocadas pelo homem. As mortes relacionadas ao calor em pessoas com mais de 65 anos aumentaram 85% no período de 2013 a 2022 em comparação com o de 1991 a 2000, muito acima do aumento de 38% esperado se as temperaturas não tivessem sofrido tanta alteração.
“Diante de projeções tão aterrorizantes, a adaptação por si só não consegue acompanhar os impactos das mudanças climáticas, e os custos estão se tornando rapidamente insuperáveis”, alerta Stella Hartinger, diretora do Centro Regional da Lancet Countdown para a América Latina. “Nós devemos fazer mais do que o tratamento dos sintomas de saúde das mudanças climáticas. Devemos nos concentrar na prevenção primária, que é o enfrentamento às causas das mudanças climáticas com a aceleração rápida da mitigação em todos os setores.”
O aumento da frequência e intensidade das mudanças climáticas extremas também compromete a segurança hídrica e a produção de alimentos, colocando milhões de pessoas em risco de desnutrição. As ondas de calor e as secas mais frequentes foram responsáveis por 127 milhões a mais passando por insegurança alimentar moderada a grave em 122 países em 2021. “Já estamos vendo uma catástrofe humana se desdobrando, com a saúde e os meios de subsistência de bilhões em todo o mundo ameaçados pelo calor recorde, secas nas colheitas, níveis crescentes de fome, crescentes surtos de doenças infecciosas e tempestades e inundações mortais”, finaliza António Guterres, secretário-geral da ONU.
Fonte: Veja
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