Aprovado pela Câmara dos Deputados na última quarta (11/9), o projeto de lei do Combustível do Futuro (PL 528/2020) segue para sanção presidencial com um mandato de redução de emissões para a aviação civil nacional, que deverá ser cumprido com o uso de combustíveis sustentáveis (SAF, em inglês).
A partir de 1° de janeiro de 2027, os operadores aéreos ficam obrigados a reduzir em 1% as emissões de gases de efeito estufa por meio do uso de SAF. Esse percentual sobe para 2% em 2029, com previsão de chegar a 10% em 2037.
É um mandato de redução de emissões, o que significa que as companhias aéreas terão certa liberdade para escolher a rota de combustível renovável que faz sentido para suas operações, combinando fatores como menor pegada de carbono, preço e oferta.
Além disso, há a previsão de uso de meios alternativos para o cumprimento da meta – algo que caberá à regulamentação definir –, e de revisão dos percentuais pelo governo, por meio do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), “por motivo justificado de interesse público”.
O texto é de iniciativa do governo federal e não deve sofrer alterações no que diz respeito ao mandato de emissões.
Mas há uma extensa lista de questões que ainda precisarão ser resolvidas após a sanção até que o novo combustível esteja disponível nos aeroportos.
Previsibilidade para indústria
“Os investimentos já anunciados no mundo para a produção de SAF nos próximos cinco anos mostra o vigor da disposição do setor produtivo para ocupar esse espaço. No Brasil, nossa vocação é imensa para ser uma referência. A segurança jurídica e a previsibilidade são fundamentais para que os projetos nesse novo mercado possam sair do papel”, comenta Erasmo Carlos Battistella, presidente da Be8.
O empresário brasileiro está investindo em uma biorrefinaria no Paraguai para fornecimento de SAF e diesel verde. A produção futura está negociada com empresas europeias.
Membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o Conselhão, Battistella tem defendido incentivos econômicos para que a indústria de SAF possa se viabilizar no Brasil, além de uma certificação global que abra novos mercados.
“A aprovação do projeto Combustível do Futuro é muito importante para colocar o país num novo patamar de investimentos, o que permitira ao país ocupar um papel de produtor e exportador de biocombustíveis ao invés de ser apenas um fornecedor de insumos para as produções nos outros continentes”, afirma em entrevista à agência eixos.
“Defendo que não deve haver restrição quanto ao uso de insumos para a produção de SAF, com uma padronização global de certificação de matéria-prima e de produto, que mantenha uma uniformidade nesse setor e que foque no que realmente importa, que é a redução de emissões com o uso de todas as rotas tecnológicas que podem contribuir com esses objetivos”.
Investimentos internacionais
Parte desses incentivos poderia vir de países ricos, muitos deles já demandantes de soluções para cumprir suas metas de descarbonização. Na presidência do G20 este ano, o Brasil tem uma oportunidade para impulsionar essa agenda.
“Sugiro que o G20 destine valores relevantes para financiar a transição energética e, além disso, crie o compromisso do setor financeiro para ter metas claras de investimentos e financiamentos para a transição com metas de restrição dessas operações em projetos que aumentem a poluição no médio prazo”, diz o CEO da Be8.
“O G20 pode mudar a realidade atual do clima no planeta, mas precisa de compromissos claros e agnósticos, acima de interesses geopolíticos”, completa.
Desafios regulatórios
Uma biorrefinaria leva em média cinco anos até sair do papel e começar a produzir combustíveis verdes. Os investimentos são na casa de bilhão de reais.
Entre consumidores, potenciais produtores, especialistas e agentes do governo há um consenso de que é preciso garantir que o impacto da transição seja o menor possível para o consumidor, sob o risco de a aviação se tornar proibitiva.
Um desafio que fica para a regulação.
“No projeto, é prevista a possibilidade de criação de diversos benefícios voltados à promoção do uso, fabricação e estruturação da cadeia de distribuição dos combustíveis verdes no mercado nacional, o que poderá ser realizado tanto por meio de vantagens regulatórias quanto pela instituição de políticas fiscais e de preços que fomentem o exercício da atividade por produtores nacionais”, analisa Helena Tuccio Teixeira, do escritório Meirelles Costa Advogados.
“No entanto, a instrumentalização da nova política de combustíveis e todos os benefícios a ela atinentes ainda deverão, após a instituição do marco legal, ser regulamentadas pelas Agências e autoridades responsáveis”, continua.
No início do mês, as agências de aviação civil (Anac) e Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) firmaram uma cooperação técnica para desenvolver esse arcabouço legal.
Há uma preocupação, por exemplo, em garantir que os incentivos sejam direcionados adequadamente.
“A ANP será encarregada de regular e fiscalizar a produção e uso, além de garantir a qualidade através de um sistema de rastreamento em todos os elos da cadeia produtiva. A implementação de sistemas de auditoria e controle de qualidade será essencial para assegurar que os incentivos fiscais concedidos sejam aplicados corretamente e para monitorar o cumprimento das metas de redução de emissões”, observa Jean Paolo Simei e Silva, sócio do Fonseca Brasil Advogados.
Reforma tributária
Silva destaca ainda que, com a reforma tributária em curso, o Brasil possui a oportunidade de estruturar novos regimes que incentivem o uso de combustíveis sustentáveis, como o SAF e o diesel verde, através de alíquotas reduzidas de IBS e CBS para produção e comercialização.
Ele também avalia que o Imposto Seletivo será outro elemento estratégico, incidindo sobre combustíveis fósseis para desincentivar seu uso e promover alternativas limpas como o SAF.
“Além das isenções tributárias, o projeto também cria espaço para a expansão de linhas de crédito verdes, que proporcionariam às empresas acesso a financiamento de baixo custo, facilitando o investimento em novas tecnologias e infraestrutura necessárias para a produção de combustíveis sustentáveis. Esses incentivos econômicos são fundamentais para que o SAF possa competir com os combustíveis fósseis tradicionais”, lista.
Fonte: Eixos
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