A elevação da mistura de biodiesel no diesel para 25% até 2035 vai exigir um volume de óleo de soja 296% maior que os 4,8 milhões de toneladas que o país usou em 2023, quando a mistura estava em 12%. Para que seja possível alcançar esse nível de produção, serão necessários investimentos de R$ 52,5 bilhões em novas usinas e esmagadoras de soja, segundo cálculos que a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) antecipou à reportagem.
Para atender a demanda, as indústrias terão de, além de aumentar a produção, direcionar para o biodiesel parte do volume de óleo de soja que hoje é exportado. Isso terá de ocorrer sem comprometer a oferta de óleo para o setor de alimentos, diz a Abiove.
O diretor de economia e assuntos regulatórios da entidade, Daniel Amaral, calcula que a demanda anual por biodiesel chegará a 21,2 bilhões de litros em 2035. Esse número leva em conta o consumo esperado de diesel, de 86,2 bilhões de litros ao ano, e o uso do óleo de soja para produzir 70% do biocombustível no país, o mesmo percentual atual. Os outros 30% são feitos a partir de sebo bovino e outras matérias-primas.
Nesse cenário, a produção de biodiesel consumirá 19 milhões de toneladas de óleo de soja por ano. Para atingir esse volume, será necessário instalar 47 esmagadoras de soja e 33 usinas de biodiesel. O país conta hoje com 129 unidades de esmagamento e 59 fábricas de refino e envase de óleo de soja. “O investimento total no setor vai ser muito maior, considerando renovação de frota e plantio, entre outras ações”, afirma Amaral.
O economista descarta a hipótese de o aumento da demanda pressionar o mercado. “A demanda para a indústria de alimentos está bastante estável. Além disso, a safra atual já é muito maior que o consumo projetado para 2035”, acrescenta.
Por enquanto, a demanda adicional de óleo para biodiesel tem sido compensada com a redução nas exportações. Em 2023, o Brasil exportou 2,6 milhões de toneladas. Neste ano, o volume deve cair para 1,15 milhão de toneladas, segundo a Abiove.
O consumo de óleo de soja no país em 2024 deverá ser de 9,7 milhões de toneladas, ou 1 milhão a mais do que em 2023. Do total, a indústria alimentícia consumirá 3,7 milhões de toneladas. O restante será para produzir biodiesel.
Alguns dos investimentos em fábricas foram revelados nos últimos meses. Em novembro de 2023, executivos de tradings como Cargill, Bunge, ADM, Cofco, Amaggi e Louis Dreyfus Company (LDC) anunciaram em Brasília que investirão US$ 10 bilhões nos próximos anos no país. Os recursos serão destinados sobretudo à área de esmagamento e produção de biocombustíveis.
A ADM investe na expansão de três unidades de processamento de grãos, em Campo Grande, Porto Franco (MA) e Uberlândia (MG), para ampliar a capacidade em 40 mil toneladas por ano. “O projeto foi concebido para atender à crescente demanda no mercado interno e à exportação de derivados do esmagamento de grãos”, afirma Jayson Lee, diretor de esmagamento de grãos da ADM América Latina. As obras devem terminar entre 2025 e 2026.
Recentemente, a ADM concluiu a compra de participação majoritária na fabricante de glicerina refinada Buckminster Química, de Macatuba (SP). Lee estima que a demanda por soja para óleo crescerá 28% neste ano. “O volume de óleo deve aumentar com a adoção da mistura de 14% de biodiesel no diesel, implementada em março”, diz. Ele acredita que o preço do óleo ficará estável neste ano, apesar do crescimento da demanda.
A brasileira Caramuru Alimentos está investindo R$ 210 milhões para dobrar a capacidade de processamento de soja em Ipameri (GO), até o primeiro semestre de 2025, para 900 mil toneladas por ano. Com isso, a companhia vai gerar 180 mil toneladas de óleo por ano.
“A duplicação vai suprir nossa necessidade de óleo para biodiesel daquela unidade”, afirma o diretor de soja da Caramuru, Cleusdimar Rodrigues da Costa. Hoje, a empresa compra de terceiros 20% do óleo que utiliza na produção do biodiesel.
A companhia também está investindo R$ 80 milhões em uma planta de glicerina em Sorriso (MT). Em outubro de 2023, a Caramuru inaugurou uma unidade de processamento de proteína de soja concentrada em Itumbiara (GO), que recebeu investimento de R$ 250 milhões e tem capacidade para 90 mil toneladas por ano. “As exportações de óleo de soja oferecem margem baixa”, diz Costa. “Assim, tudo que puder agregar valor à produção local é vantagem.”
Como parte da estratégia para ampliar sua atuação em biodiesel, a Cargill adquiriu em 2023 ativos da Granol — três fábricas de esmagamento de soja e produção de biodiesel, em Anápolis (GO), Porto Nacional (TO) e Cachoeira do Sul (RS), além de quatro armazéns. Com esses ativos, a gigante passou a ter quatro usinas, com capacidade de 1,53 milhão de metros cúbicos de produção de biodiesel. Com isso, se tornou uma das maiores em biodiesel no país.
Em recente entrevista à reportagem, o presidente da Cargill, Paulo Sousa, disse que parte dos investimentos da empresa previstos para este ano será destinada ao aumento de capacidade e à melhoria de eficiência das fábricas compradas da Granol. “Infelizmente, não há outra Granol na prateleira”, afirmou, numa indicação de que a Cargill segue atenta a eventuais oportunidades para ampliar o esmagamento de soja no Brasil.
Procuradas pela reportagem, Amaggi, Bunge, Cofco e LDC não quiseram detalhar seus planos.
Fonte: Globo Rural
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