O Brasil vai precisar de investimentos da ordem de R$ 1 trilhão para alcançar os compromissos de redução de emissão de carbono até 2030, mostra estudo inédito do Fórum Econômico Mundial em parceria com a consultoria Oliver Wyman, enviado com exclusividade ao Estadão/Broadcast. O desafio, porém, não é só financeiro. Após nove meses de encontros com os maiores nomes do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, além de representantes do governo e da academia, a conclusão do Fórum é de que o País precisa consolidar uma “narrativa comum” para atrair investimentos e guiar o setor privado, especialmente após as “mensagens mistas” emitidas nos últimos “par” de anos.
Embora os detalhes do Plano de Transformação Ecológica (PTE) do governo façam falta, a expectativa é de que o Brasil tenha sucesso nos próximos fóruns internacionais para recuperar o protagonismo na agenda ambiental - uma das principais bandeiras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É urgente, contudo, reverter o desmatamento ilegal e agir na transição do setor agropecuário.
O relatório final do estudo, resultado de workshops, entrevistas com empresas e especialistas e trabalho de pesquisa desde outubro de 2022, será divulgado hoje (24) em evento em São Paulo.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Kai Keller, líder de engajamento empresarial, estratégia regional e parcerias do Fórum Econômico Mundial, afirmou que a expectativa é de que essa “narrativa comum” seja articulada pelo governo brasileiro na Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU) em setembro, em que o Brasil tradicionalmente faz o discurso de abertura, e na Conferência do Clima (COP), em novembro, em Dubai.
“Nós sempre queremos nos mover mais rápido do que nos movemos quando se trata da agenda climática, porque nós sabemos as consequências de não agir. Mas estou muito confiante de que, quando estivermos em Dubai para a COP deste ano, o Brasil terá uma narrativa atraente para contar”, disse.
O relatório reconhece que o País está, neste momento, buscando recuperar o papel de liderança que tinha nos primeiros anos do século 21, com o PTE, que inclui o projeto do mercado regulado de carbono e a iniciativa para a criação de uma taxonomia nacional, e com o Comitê Interministerial de Mudança do Clima. “O compromisso do Brasil em combater a mudança climática está se fortalecendo”, diz o texto.
Mas Keller pondera que os detalhes do Plano de Transformação Ecológica fazem falta. O governo pretende apresentá-los ainda neste mês. “Quando se trata do governo, a indústria diz que precisa dos incentivos certos e de taxonomia. Isso ainda está faltando”, alerta.
Metas e desafios
Conforme o compromisso atual no Acordo de Paris, a meta do Brasil é reduzir em 50% as emissões de carbono até 2030, tendo como base os níveis de 2005. Em 2050, chegaria à neutralidade. O País era o sexto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo em 2019, sendo responsável por cerca de 3% das emissões globais.
Uma das principais conclusões do estudo do Fórum é de que os setores produtivos precisam de maior clareza sobre os caminhos específicos que têm de trilhar para chegar às suas metas individuais de redução de emissão de carbono - que ainda não foram definidas e precisam de uma articulação do governo.
Particularmente, é urgente encaminhar a transição do setor agropecuário, segundo maior responsável pelas emissões de gases de efeito estufa no País - uma particularidade em relação a outras economias do mundo. O principal culpado é o desmatamento, que cresceu nos últimos anos e alcançou os maiores níveis em mais de uma década em 2021 - manchando a imagem ambiental do País durante o governo de Jair Bolsonaro. Juntos, o agro e o desmatamento, também impactado pelo avanço da fronteira agrícola e por atividades como o garimpo ilegal, representam 70% das emissões brasileiras.
“Os padrões das emissões no Brasil são muito diferentes da China, EUA e Europa por causa da matriz energética renovável. E por isso que agricultura e desmatamento são tão importantes para o Brasil. A indústria ainda é importante, mas vamos atingir nossos compromissos se formos capazes de controlar o desmatamento e também de migrar para uma agricultura de baixo carbono”, diz Guilherme Xavier, sócio da Oliver Wyman Brasil.
Para Keller, o principal desafio quando se trata da descarbonização do setor agrícola é balancear as prioridades. A questão é que a transição do setor precisa ocorrer ao mesmo tempo em que o mundo enfrenta uma crise de segurança alimentar - e o Brasil é um grande fornecedor global. “Não é nosso papel articular como isso pode ser feito, podemos dar ideias, mas no final a decisão é do governo.”
Financiamento
Um dos maiores desafios da agenda de transição no Brasil, porém, é o dinheiro. Xavier afirma que serão necessários recursos estrangeiros, financiamento dos bancos brasileiros e também algum suporte do governo - o que preocupa em meio à forte restrição orçamentária do País - para alcançar o montante trilionário estimado pela consultoria para bancar a transição climática.
O estudo pontua que o Brasil precisa também sofisticar os instrumentos financeiros, aumentando a emissão de títulos vinculados à agenda ambiental, social e climática (ESG, na sigla em inglês). Nesse sentido, o título verde que o Tesouro Nacional pretende levar a mercado entre setembro e novembro deve ser importante, mas não suficiente.
Para convencer o capital privado internacional a entrar no barco, o relatório do Fórum Econômico Mundial deve ser um importante instrumento. “É por isso que a narrativa é tão central. Quando se articula o papel que o País quer desempenhar, traz bastante segurança para os investidores estrangeiros, que receberam mensagens mistas sobre o compromisso do País nos últimos anos par de anos”, diz Keller.
Fonte: Estadão
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