Nessa sexta-feira (08), o setor teve que se desdobrar. De um lado, o Leilão 82 estava negociando o biodiesel que será usado no sexto bimestre deste ano. Do outro, a ANP estava realizando uma audiência pública que deverá ajudar a definir todo o futuro da indústria. Nela, estava sendo debatida a minuta de uma resolução que vai formatar o novo modelo de comercialização que, a partir do começo de 2022, deverá substituir sistema de leilões públicos de biodiesel.
Embora o governo já venha sinalizando há mais de um ano que os leilões de biodiesel estão para acabar. A formatação do novo modelo só ganhou tração no fim de abril quando a ANP aprovou um relatório com as diretrizes desse novo modelo.
Outros três se passaram antes da minuta da resolução que vai sacramentar a mudança fosse oficialmente apresentada ao mercado. A audiência de sexta-feira foi o último passo no processo de elaboração do novo conjunto de regras que recebeu um total de 15 manifestações ao longo do processo de consulta pública.
Oposição
Entre os fabricantes é forte a oposição ao modelo. O superintendente da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), Julio Cesar Minelli, chegou a alertar para o risco de “colapso do setor” caso o governo insista em avançar com a mudança do modelo a partir da virada do ano. “Introduzir o novo modelo carrega um risco muito elevado”, reclama acrescentando que se a mudança for implementada já virada do ano o mercado teria pouco mais de seus meses para elaborar contratos que hoje ainda não existem e conseguir fechar a compra de todo o volume de biodiesel que será necessário para abastecer o mercado no primeiro bimestre do ano que vem.
“Temos que negociar bilhões de reais partindo do zero. As negociações nem foram iniciadas ainda”, preocupa-se acrescentando ainda que a proposta elaborada pela ANP foca excessivamente no funcionamento das contrações entre usinas e distribuidores deixando em aberto outros pontos que seria igualmente importantes. “O ponto central da regulação teria que ser as entregas que é o que realmente garante o abastecimento”, pontuou.
Não é o único ponto que preocupa os fabricantes, Julio Cesar também destacou a indefinição sobre como vai funcionar a tributação no novo modelo de comercialização. Ele destacou a recente manifestação do Comitê Nacional de Secretários da Fazenda (Comsefaz) pedindo que a mudança fosse adiada até abril de 2022 para que o problema pudesse ser resolvido.
Donizete Tokarski se mostrou igualmente preocupado sobre os efeitos que a mudança pode ter nas empresas do setor. Segundo o diretor da União Brasileira do Biodiesel e do Bioquerosene (Ubrabio), a entidade que ele representa entende que “a mudança não deveria estar acontecendo agora”. “Estamos numa situação quase irreversível para um mercado que é muito importante para a sociedade brasileira”, afirmou protestando que os produtores têm sido pouco ouvidos ao longo de um processo que vem sendo conduzido pelo governo forma açodada.
Prazo apertado
“O CNPE que nos deu esse prazo ínfimo que nos coloca nessa situação de estarmos a pouco menos de três meses [da mudança] e não sabermos qual vai ser esse novo modelo (...) ainda estamos discutindo como ele deve ser”, reclamou questionando se a ANP já conta com todo o instrumental que seria necessário. “Os sistemas de controle já foram montados? Estão validados? O pessoal [da agência] já está capacitado?”, provocou defendendo que os leilões sejam mantidos. “A gente entende que os leilões deveriam ser mantidos”, completou.
O prazo exíguo também apareceu na fala do presidente do Sindicato da Indústria de Biodiesel e Biocombustíveis do Rio Grande do Sul (Sindibio-RS), Irineu Boff. “A malha tributária é muito complexa e foi dado um prazo muito pequeno para que os estados adaptassem a legislação para não destruir o setor de biodiesel”, destacou exigindo “mais cuidado” com um setor que, via Selo Biocombustível Social, gera renda para 74 mil famílias de agriculturas familiares.
Segundo Irineu Boff, da mudança tem ainda outros riscos como a liberação da importação de biodiesel. “Tem uma ameaça que são as importações que chegariam com um dumping gigantesco (...) o programa [do biodiesel] tem que ser preservado”, prossegue.
A abertura do mercado para importações também incomodou o diretor da Granol, Juan Diego Ferres. “Não seria imaginável a sociedade brasileira pagar por um biocombustível que gera externalidades em outros países”, reclamou acrescentando que o sistema de leilões está sendo precipitadamente descartado. “O leilão é tão livre quanto qualquer outro sistema de mercado pode ser”, ponderou.
Metas
Menos avessa à mudança de sistema do que outras organizações do setor produtivo, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) foi representada na audiência por Gustavo Assis que afirmou que, embora a entidade não se oponha a mudança de sistema são necessárias mudanças na proposta da ANP entre as quais o fim da imposição de metas de venda aos fabricantes. Pela minuta, os maiores produtores de biodiesel seriam obrigados a garantir, a cada bimestre, a venda de pelo menos 80% do volume que comercializaram no mesmo período do ano anterior.
Na opinião da Abiove, além do risco de criar uma classe de usinas ‘vagalume’ que entram e saem do regime de metas; obrigar as usinas a venderem poderia fragilizar sua posição no mercado. “Ter o mesmo regime de metas colocaria as distribuidoras em condição dominante e elas poderiam impor condições para as usinas distorcendo o mercado”, destaca.
Distribuidores
Não são apenas as usinas que têm críticas ao modelo proposto pela ANP. O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) destacou a falta de um referencial público de preços uma vez que o mercado não vai mais contar com a transparência dos leilões púbicos. “É possível que surjam indicadores (...), mas a [ANP] poderia se antecipar e desenvolver ferramentas”, avaliou o gerente de regulação da organização, Samuel Luiz de Carvalho.
A necessidade de um índice de preços para o biodiesel também foi destacada nas apresentações da Petrobahia e da Federação Brasilcom.
O representante do IBP também pediu que a ANP continuasse a exigir a regularidade fiscal das usinas de biodiesel – algo que acontece no atual sistema de leilões e não está prevista no novo modelo – pelo menos de forma anual. A inclusão de uma regra que garanta que as empresas do setor de biodiesel mantenham sua regularidade fiscal foi um ponto que também trazido na apresentação da Raízen.
Outra associação do setor de distribuição, a Federação Brasilcom se declarou favorável à mudança do modelo de comercialização embora ressalte a necessidade de uma regra de transição para o mercado. “A Brasilcom é a favor do fim dos leilões, mas para não criar assimetrias as regras têm que estar definidas”, afirmou o diretor da entidade Carlos Germano.
Fonte: BiodieselBR
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